quarta-feira, 21 de dezembro de 2011


Nunca te vi, sempre te amei...

Querida Sampa.

           Demorou longo tempo,  44 anos pra despertar em mim, desejo de te conhecer de perto. E mesmo assim, nem tão perto foi, pois ainda me faltam alguns ares de garoa pra respirar, alguns lugares pra pisar, alguns olhos pra fixar, algumas paisagens pra nunca deixar...
Me vi saindo da estação Santa Cruz, nas primeiras horas do dia,vislumbrei uma catedral linda,  e meu coração bateu como um coração paulista, um anonimato que antecedeu meus dias de poeta, quando escrevia pra você sem lhe conhecer. Senti meu corpo pulsar numa euforia de encontrar uma cidade imensa acordando, e alguma flor de jardim me esperando.
Segui meu roteiro ate o  Alto do Ipiranga, vendo o dia nascer feliz em ruas novas, retratos de dias que nunca vivi.
            No meu destino vi a flor mais linda nascida em São Paulo, a lótus, a petúnia, a flor de Vênus...
Era eu, e era Eros e Psiquê também em contraste com o que eu sou, e não sabia.
Pisando então no seu Jardim do Museu do Ipiranga, caminhei numa trilha orvalhada com a tal  flor a me seguir, os passos confusos, as mãos trêmulas, eu estou aqui...
No quarto de hotel, as horas eram como águas turvas, mas ao mesmo tempo límpida me diziam...é,  você está aqui! Vibrei, me confundi, tropecei, liguei. Era a hora do dia, mas minhas horas internas eram de uma madrugada carente, solitária, esperando por algo.
A refeição ficou pra depois, o pensamento pra depois, a música pra depois, a razão pra depois, mas a emoção ficou ali bem naquele momento presente.
Descobri que éramos eu e minha poesia naquele quarto de metrópole, nesta que você só conhecia por manchetes, geografia, história, mapas, contos e telefonemas.
Sono veio a me embriagar depois que o dia com você se foi, Sampa...
Não consegui dormir, sai, me iludi, me perdi, me voltei e adormeci.
Despertei como quem desperta de uma viagem insólita e exultante as 5 horas da manhã, da minha manhã...
Carência, mas você Sampa, linda veio me abraçar e despertar meu dia, que nem sei o que seria...
Cada vez que uma esquina de ti eu deixava, me partia despedir de uma cidade que estava em mim e eu não percebia.
Conversando novamente com Ipiranga, não via a hora de ver novamente a Sampa que vi, na alvorada do dia.
E quando de verdade te toquei, nunca mais a deixaria, Sampa minha poesia, Sampa minha querida.
           Mudando de estação, pisei na sua filha Paulista, a mais vaidosa e exuberante avenida.
Era eu, mas era tambem uma moça perdida, curiosa e indecisa, pra onde quero ir? Onde quero estar? Será aqui?
Abracei o bosque surpreendente da Pinacoteca, comi um prato exótico, que você me ofereceu naquele cardápio mudo, que só me enlouqueceu.
Língua Portuguesa, ah como me emocionei por ter olhos pra ver o que meu propósito me levou a buscar, a realizar...
Palavras, palavras, por onde a língua portuguesa passou, eu nunca hei de passar, mas minha mente viaja.
Gente, gente, tempo, tempo, tempo, senhor do destino...multidão. Como será a vida de cada um desses rostos?
Quero ver de perto, e vi...
Me embriaguei na véspera de te deixar, mas que seja breve meu retorno.
Cenário de amor com você, a bela Sampa...
Meu coração, mente, pele, libido, intelecto, êxtase físico, e dor, tudo se misturando ali, bem no bairro do Grito, Ipiranga, onde me lancei intensamente só com o que buscava...
Foi duro me despedir ali, de vc, Paulista, mas me atrevi a chorar, ao te ver passar pelas janelas do MASP, pelas lojas e vitrines nada recatadas, pelas moças humildes e homens sutis...
            A noite no bar, a lua de Sampa, iluminando você, a mesma lua em todos os lugares, zona leste, zona sul, oeste e norte, mas meu coração num só lugar, ali, eu e você.
Manhã de despedida, fui sem rumo abraçar e cheirar você mais uma vez, seu coração bem no meio do Pateo do Colégio, batizado por Jesuítas há tanto tempo, e hj ainda me faz orar...
Que emoção, estar ali, você me proporcionando estar no pátio do Mário de Andrade, na Sé de todas as fés, no Theatro de todas as óperas, no viaduto do chá, um Chai Chinês...
Que bom estar ali, partindo, mas deixando algo que em mim ficou, e que agora deixo pra você, o que eu era, e o que agora sou, apenas por estar em você, Sampa.
E por fim, abraçando uma bandeira quatrocentona, onde dizia, AQUI QUE TUDO COMEÇOU...e nada fará acabar, nem mesmo um adeus...
O que hoje, me permite dizer de tudo isto; saudades de você, Sampa...

Eu morro ontem, nasço amanhã, o meu tempo é quando...
Caetano, voz da Bethânia.

Mônica Ribeiro
01/08/11

2 comentários:

  1. há sabor de definição impossível visto a sua própria natureza exclusiva, há sensações indescritíveis pela subjetividade com que nos permitimos vivenciá-las. Assim me ocorreu com seu texto: é para ser sentido antes mesmo que compreendido. Eu senti, acredite ! Parabéns pelo blog. Sucesso.
    By Vênus

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